A REVOLTA ARMADA


Fortaleza de Santa Cruz, onde Wandelkolk ficou aprisionado.
Quadro de Batista da Costa, Museu da República.



A Revolta da Armada.
Museu Histórico Nacional.

A REVOLTA DA ARMADA

A perspectiva da sucessão presidencial se associou à revolução federalista para agitar novamente as forças armadas. A Marinha vivia em constante estado de insatisfação. Após a queda de Deodoro, o Contra-Almirante Custódio José de Mello pretendia suceder Floriano Peixoto. As divergências quanto ao tratamento dado à revolução federalista levaram-no a renunciar ao ministério. O clube Naval, por sua vez, elegeu como seu presidente o almirante e senador Eduardo Wandelkolk, ferrenho opositor de Floriano.

Wandelkolk tentou atacar, sem sucesso, o porto do Rio Grande, em auxílio aos federalistas em julho de 1893. Foi aprisionado e levado à Fortaleza Santa Cruz. A Marinha viu o ato como uma ofensa à corporação, mobilizando os seus oficiais para a revolta. Receberam o apoio de monarquistas, deodoristas, federalistas e das oposições em alguns estados. O veto à lei declarando inelegível o vice-presidente do quatriênio anterior confirmou as suspeitas de continuísmo. No dia 6 de setembro de 1893, o almirante Custódio José de Mello içou a bandeira branca da revolta no encouraçado Aquidabá, prometendo restaurar o império da constituição. Os revoltosos dominaram o porto e, no dia 13, começou o bombardeio da cidade do Rio de Janeiro.

O governo, contando com o Exército, com São Paulo e com a adesão popular, logo se organizou para a reação. O manifesto de tendência ajudou a mobilizar civis e militares. Os revoltosos abriram novas frentes de luta no sul do país, tomando o porto de Desterro, atual Florianópolis. A contra-ofensiva do governo foi violenta, incluindo decretação de estado de sítio, censura da imprensa, prisão de suspeitos e formação de uma nova esquadra.

Os rebeldes não conseguiram apoio em outras unidades da federação e sofreram derrotas. Impossibilitados de sair para o alto mar, e vendo negadas suas propostas de acordo, Saldanha da Gama e 525 companheiros se asilaram em navios portugueses. Daí foram para a Argentina e Uruguai, onde se reuniram como os federalistas e tramaram nova invasão. No Paraná e em Santa Catarina, Moreira César promovia perseguições e vinganças que terminaram em fuzilamentos e assassinatos. Em junho de 1895, Saldanha da Gama morreu na guerra do Rio Grande do Sul.

Em 1894, os legalistas infligiram sérias derrotas aos revoltados em Santa Catarina e na Campanha, culminando com a morte de Gumercindo. Sua tumba foi descoberta e seu cadáver mutilado. Os rebeldes recuaram para o Uruguai e Argentina a fim de se reorganizar. Após algumas incursões, tentaram nova invasão, sob o comando de Saldanha da Gama e Joca Tavares. Os revoltosos federalistas e da Marinha foram derrotados em junho de 1895.

"Proclamação do Contra-Almirante Custódio José (6/9/1893)

A Marinha não apoiara o golpe de 10 de abril de 1892, porém logo vai arrepender-se. Floriano encontra-se diante da revolução federalista no Rio Grande do Sul, iniciada em 2 de fevereiro de 1893, mas conta com o apoio do exército e dos Estados, depois de vencidas todas as oposições estaduais. A esta vitória parcial segue-se, porém, a exigência do Partido Republicano Federal de escolher o candidato à presidência (abril, 1893). Os jacobinos pensam em contrapor-se e indicar Floriano para a reeleição; a ajuda das oligarquias, no entanto, era o baluarte de seu governo, e a crise das candidaturas significaria o enfraquecimento de seu poder. Aquela decisão do Partido Republicano Federal leva Custódio a afastar-se do Ministério, pois pretendia candidatar-se.

Seu afastamento é seguido de atos de hostilidade ao governo: almirantes recusam substituí-lo; a Marinha abre subscrição pública para ajudar os revolucionários do Rio Grande do Sul; Wandekolk (6/7/1893) entra em contato com revolucionários rio-grandenses e tenta tomar o porto do Rio Grande. Finalmente, mesmo sem a adesão do Almirante Saldanha e com poucas ligações em terra, Custódio tenta obrigar Floriano a renunciar, numa repetição do 23/11/1891.

Concidadãos - O movimento revolucionário de 23 de novembro não teve outro fim senão restaurar o regime constitucional e a ação dos poderes constituídos que o golpe de estado de 3 de novembro aniquilava com assombro geral da Nação e, principalmente, de todos quantos eram responsáveis pela formação do governo republicano.

A ditadura de 3 de novembro não visou outros intuitos, com efeito que o da irresponsabilidade da administração na questão financeira da República: se por um lado acenava às ambições inconfessáveis e aos interesses menos legítimos, por outro abatia o caráter nacional, ludibriava-o fazendo crer que a Nação, incapaz de criar para si instituições livres, e de viver à sua sombra, recebera submissa e sem protestos o jugo de uma autocracia que era um vilipêndio e significava uma humilhação.

Sabeis a parte que a mim coube, determinada pelos acontecimentos, nesse memorável período da ação revolucionária contra o arbítrio do poder: servi a causa dos interesses populares de 23 de novembro; estive no posto que do meu pundonor como militar e da compreensão dos meus deveres cívicos, como brasileiro, a Pátria tinha o direito de exigir que eu ocupasse.

E se, depois desse dia, algumas parcelas da pública autoridade vieram até à modéstia do meu lar, não o foram pelas sugestões da própria vontade, mas pela responsabilidade política, que as vicissitudes da Revolução, criando uma nova ordem de coisas, determinaram.

No governo, e até quando a ele pertenci, procurei manter firme os meus intuitos patrióticos, sustentando com inquebrantável lógica a supremacia da Constituição e a submissão à Lei.

Nem um só dia se passou que, como ministro, eu não estivesse de atalaia em prol dos direitos e das liberdades populares contra a ação invasora e absorvente de uma forma de administração que, enfeixando nas próprias mãos todas as funções políticas da Nação, todas as manifestações da soberania popular, tendia, de arbítrio em arbítrio, de prepotência em prepotência, escalar todas as ameias dos poderes políticos e anular todas as regalias constitucionais.

Contra a Constituição e contra a integridade da própria Nação, o chefe do Executivo mobilizou o exército discricionariamente, pô-lo em pé de guerra e despejou-o nos infelizes Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Contra quem? Contra inimigo do exterior, contra estrangeiros? Não. O vice-presidente da República armou brasileiros contra brasileiros; levantou legiões de supostos patriotas, levando o luto, a desolação e a miséria a todos os ângulos da República, com o fim único de satisfazer caprichos pessoais e firmar no futuro, pelo terror, a supremacia de sua ferrenha ditadura.

Sentinela ao tesouro nacional como prometera, o chefe do Executivo perjurou, iludiu a Nação, abrindo com mão sacrílega as arcas do erário público a uma política de suborno e corrupção, sacrificando a autoridade que, em má hora, a revolução de 23 de novembro em suas mãos depositou.

A bancarrota já nos bate à porta; ela aí está com todo o seu cortejo de horrores e misérias.

......…………………………………………………………………………….....

Oficial de Marinha, brasileiro e cidadão de uma pátria livre, ainda uma vez vou achar-me no campo da ação revolucionária para dar combate aos demolidores da Constituição e restaurar o regime da lei, da ordem e da paz.

Nenhuma sugestão de poder, nenhum desejo de governo, nenhuma aspiração de exercer mandatos por esforço violento da própria individualidade, me levam à revolução.

Que a Nação Brasileira possa e saiba exercer a sua soberania dentro da República, eis o meu desideratum, eis a cogitação suprema do meu espírito e de minha vontade.

Viva a Nação Brasileira!

Viva a República!

Viva a Constituição!

Capital Federal, 6 de setembro de 1893.

Custódio José de Mello"

0 comentários:

Postar um comentário